Artigo Nº 57 – VELHAS DÍVIDAS ASSUSTAM

De Salvador recebemos solicitação de esclarecimento de importante questão imobiliária, de grande interesse para quem pretende adquirir um apartamento em condomínio, por envolver dívidas pretéritas e má gestão administrativa de síndicos desinformados ou mal assessorados.
 

1) Em fevereiro de 1995, adquiri um apartamento para as minhas filhas menores, que precisavam estudar em Salvador. Na ocasião o síndico forneceu à vendedora e ex-proprietária uma declaração de que havia quitado as taxas mensais do condomínio, até aquela data, nada havendo portanto que impedisse de lavrar a escritura. Em março de 1997, fui procurado pelo novo síndico, que me apresentou a cobrança de uma taxa extra, no valor de R$ 684,00 para recolhimento do INSS e FGTS do zelador, que o condomínio deixara de recolher do período compreendido entre os anos de 1989 e 1995. Relutei em pagar, aleguei a declaração de não existência de débitos fornecida pelo síndico em março de 1995, porém acabei pagando e forneceram-me recibo. Em julho de 1998, fui informado que existem outros débitos juntos ao INSS e FGTS, do mesmo zelador, e relativos a diversos meses dos anos compreendidos entre 1978 e 1995.

Pergunto:

a)Sou obrigado a pagar estes débitos, já que durante o período 1978 a 1995, o apartamento teve diversos proprietários.

b)Devo considerar-me lesado e ludibriado pela declaração fornecida para a lavratura da escritura em cartório?

c)O apartamento responde pelo débito junto ao INSS e FGTS?

d)Deverei acionar judicialmente os ex-proprietários? Por favor, peço-lhe que me oriente, já que os débitos equivalem a um quarto do valor do apartamento, devido às correções, multas e juros de mora.

Resp.:  Em primeiro lugar, permita-me dizer-lhe que seu caso específico serve de alerta para qualquer pessoa que pretenda comprar um apartamento em edifício, pois poucos se dão ao trabalho de averiguar qual a situação jurídica do imóvel e, até o momento, ninguém se preocupava em verificar qual a posição econômico-jurídica do condomínio. Por isso, transcrevi sua pergunta quase na íntegra, omitindo apenas detalhes que desviariam a atenção do mais importante.

Diz a Lei do Condomínio que “a alienação ou transferência de direitos de que trata este artigo dependerá de prova de quitação das obrigações do alienante para com o respectivo condomínio”(art. 4o, parág. único). A prova de que o alienante está em dia com o condomínio são os recibos (todos os recibos) de que pagou suas contribuições e rateios ao condomínio, como é sua obrigação. Aceita-se, para facilitar, que o síndico dê uma declaração de que não existem débitos do promitente vendedor até a data da declaração.

No seu caso, o vendedor  agiu corretamente ao solicitar ao síndico que lhe desse uma declaração nesse sentido. O síndico da época, provavelmente, também agir com lisura ao fornecer a declaração de inexistência de débitos. Não nos parece ter havido má fé de qualquer das partes.

Porém, a declaração não foi dada no sentido de que o vendedor ou V.Sa. ficariam isentos e imunes de qualquer débito do condomínio que tivesse origem em data anterior a março de 1995. Pense bem, a declaração é de que “o condômino-proprietário fulano de tal” não tem débito perante o condomínio, não de que “o condomínio tal e qual” não tem débitos pendentes perante terceiros. Mesmo que a declaração fosse feita nesse sentido, seria nula de pleno direito, porque o síndico não tem o poder legal de dispor do patrimônio do edifício, isentando este ou aquele condômino do pagamento de suas contribuições.

O que, aparentemente, ocorre é que os débitos do condomínio para com o INSS e o FGTS não eram do conhecimento dos condôminos e talvez não do síndico que forneceu a declaração referida. Eram dívidas do condomínio, ou seja, de todos os condôminos, mas que não haviam ainda se tornado exigíveis de cada condômino em particular porque nunca foram apresentadas para pagamento, o que só foi feito, parcialmente, segundo seu relato, em março de 1997.

Não há dúvida de que a dívida de condomínio é “própria da coisa”, que segue a unidade independente de quem seja seu proprietário. Tem esse caráter por força de lei , mas principalmente porque é esta a sua natureza, como já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, como já publicamos algumas vezes em nossa coluna. Os gastos do condomínio são feitos com o fito de conservar, proteger e garantir a integridade física das unidades, logo, quem responde pelo seu pagamento é o próprio bem. A dívida não tem natureza pessoal. 

Portanto, respondendo, objetivamente suas questões:

a)Sim, V.Sa., na qualidade de novo adquirente do imóvel, está obrigado a pagar os débitos de condomínio tardiamente cobrados.

b)Não, V.Sa. não se deve considerar lesado e ludibriado pela declaração fornecida, porque aparentemente o síndico da época desconhecia a existência do débito do condomínio junto ao INSS e FGTS.

c)Sim, o apartamento responde pelos débitos do condômino perante o condomínio e também pelas dívidas do condomínio perante terceiros.

d)Sim, se V.Sa. tiver que pagar ao condomínio ou aos exeqüentes, terá direito de regresso contra quem lhe vendeu o imóvel, por todo o débito passado, ou direito de ressarcimento contra cada um dos antigos condôminos, pelo débito correspondente ao período em que tiveram a propriedade do bem. Os riscos da evicção correm por conta do alienante, como bem definiu nosso Código Civil (art. 1.107 e seguintes).

Lamentavelmente, não podemos lhe dar um parecer mais favorável aos seus interesses. Sugerimos que se aprofunde mais sobre a questão dos débitos do condomínio, se havia execução fiscal, se o condomínio foi devidamente citado etc. e que procure um advogado em sua cidade para a defesa de seus direitos.