Você confia no administrador público municipal? Se confia, não tem muito com o que se preocupar, mas se não confia, é bom passar a acompanhar o que o legislador fará daqui para a frente, com base nos imensos poderes que lhe foram conferidos pelo Estatuto da Cidade, como estamos vendo nesta série. Entre outras novidades, a Lei 10.257/01 dá ao município a capacidade de estabelecer áreas onde terá o direito de preferência, preço por preço, sobre qualquer venda de imóvel entre particulares.
O direito de preempção do município, embora de caráter provisório e delimitado, representará, sem dúvida, um obstáculo aos proprietários que forem diretamente atingidos. O texto legal é longo, mas vale conferir.
“Art. 25. O direito de preempção confere ao Poder Público municipal preferência para aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares.
§ 1o Lei municipal, baseada no plano diretor, delimitará as áreas em que incidirá o direito de preempção e fixará prazo de vigência, não superior a cinco anos, renovável a partir de um ano após o decurso do prazo inicial de vigência.
§ 2o O direito de preempção fica assegurado durante o prazo de vigência fixado na forma do § 1o, independentemente do número de alienações referentes ao mesmo imóvel.”
Pausa para comentário. O direito de preferência do município não afeta transmissões graciosas do imóvel, como doações, nem decorrentes de herança. Somente as alienações onerosas, em que há pagamento de preço certo pelo comprador, ficarão atingidas.
Sem plano diretor, a cidade não poderá implantar áreas de interesse aquisitivo. Uma vez esgotado o prazo inicial de até cinco anos, haverá necessariamente um interregno de um ano, antes que o legislador municipal possa afetar novamente a área, colocando-a sob a incidência do direito de preempção. É assim que entendemos o parágrafo primeiro do art. 25, salvo engano.
"Art. 26. O direito de preempção será exercido sempre que o Poder Público necessitar de áreas para: I – regularização fundiária; II – execução de programas e projetos habitacionais de interesse social; III – constituição de reserva fundiária; IV – ordenamento e direcionamento da expansão urbana; V – implantação de equipamentos urbanos e comunitários; VI – criação de espaços públicos de lazer e áreas verdes; VII – criação de unidades de conservação ou proteção de outras áreas de interesse ambiental; VIII – proteção de áreas de interesse histórico, cultural ou paisagístico; IX – (vetado).
Parágrafo único. A lei municipal prevista no § 1o do art. 25 desta Lei deverá enquadrar cada área em que incidirá o direito de preempção em uma ou mais das finalidades enumeradas por este artigo."
Os motivos que justificam a imposição do direito de preferência parecem ser relevantes, como o são todos os propósitos do Estatuto da Cidade. Preocupa-nos a concretização da lei, uma vez que coloca em mãos dos dirigentes municipais poderes que poderão ser facilmente desvirtuados, por razões ou desrazões políticas, o que deixa o munícipe na mão do mau administrador.
Prefeito nenhum terá, por exemplo, dificuldade em enquadrar qualquer área do município num dos oito incisos do artigo 26, já que bem abrangentes. Tampouco a lei impede que áreas isoladas ou minúsculas sejam atreladas ao direito de preempção, sem que as da vizinhança recebam o mesmo tratamento.
No artigo 27, a lei da cidade mostra como se operará o direito de preempção, o que, por falta de espaço, veremos na próxima semana.