Artigo Nº 205 – ESTATUTO DA CIDADE – 4 – A COMPETÊNCIA DA UNIÃO

Em nossa paulatina incursão ao Estatuto da Cidade, chegamos hoje ao fim do primeiro capítulo, que trata das diretrizes gerais da nova política urbana. Já vimos que a Lei 10.257, de 10 de julho passado, regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal e tem os melhores propósitos, dificilmente atingíveis a médio ou mesmo longo prazo.

O último artigo do Capítulo I diz o seguinte:
“Art. 3o Compete à União, entre outras atribuições de interesse da política urbana:
I – legislar sobre normas gerais de direito urbanístico;
 II – legislar sobre normas para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios em relação à política urbana, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional;
III – promover, por iniciativa própria e em conjunto com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico;
 IV – instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos;
V – elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social.”

Pelo que se depreende do inciso III, o Estatuto da Cidade abre as portas para o lançamento de “programas de construção de moradias” à margem do Sistema Financeiro da Habitação, ou seja, para fins que não sejam apenas os da casa própria. Por exemplo, programas de locação de casas populares e semelhantes poderão ser criados para beneficiar pessoas de baixa renda, aposentados, funcionários públicos e outros segmentos da população. Percebe-se, na lei, sua nítida inspiração em políticas urbanas prevalentes em outros países, onde o importante não é a propriedade do imóvel residencial mas a disponibilidade de espaço digno para residência. Se foi essa a intenção do legislador, merece aplausos.

Em termos de abertura de oportunidades, o Estatuto da Cidade também amplia o campo profissional das pessoas envolvidas com o “direito urbanístico” (inciso I), como advogados, arquitetos, engenheiros, sociólogos e outros. Haverá estímulo ao crescimento econômico e não à estagnação?  Nesse ponto, esperamos sinceramente que a lei não mereça o mesmo destino que o Estatuto da Terra (Lei 4.504/64), que, ao invés de gerar riqueza no campo e uma melhor distribuição dos bens produzidos, foi um dos principais fatores do surgimento dos bóias-frias, de triste memória, hoje suplantados pelos desesperados sem-terra.

É de se esperar que surjam muitos conflitos de competência entre a União, os estados e os municípios no momento da elaboração de leis aplicáveis à cidade. A União reservou-se o direito de legislar sobre “normas gerais” de política urbana (caput), restando aos estados e municípios a competência subsidiária, se bem que, na prática, serão os municípios que maior impacto trarão à paisagem urbana, já que a eles cabe a elaboração do plano diretor e outros instrumentos de concreção da lei.

Ressalte-se, ainda, que dois dos cinco incisos citados pregam a “cooperação”  (II) e o trabalho “conjunto” (III) entre as entidades públicas mencionadas, o que não é novidade, mas merece registro e aumenta as boas expectativas.

Na próxima semana continuaremos com parte do Capítulo II.

Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (41)224-2709, fax (41)224-1156, e-mail lfqueirozadv@softone.com.br