Artigo Nº 211 – ESTATUTO DA CIDADE – 10 – USUCAPIÃO COM PRIVILÉGIOS

Na semana passada mostramos que, através de usucapião especial urbano coletivo, o Estatuto da Cidade pretende criar condições para que favelas e áreas de invasão possam se transformar em condomínio especial. Concluímos hoje a Seção V do Capítulo II da Lei 10.257/01, com mais detalhes sobre o usucapião referido.

Estabelece a lei:
“Art. 11. Na pendência da ação de usucapião especial urbana, ficarão sobrestadas quaisquer outras ações petitórias ou possessórias, que venham a ser propostas relativamente ao imóvel usucapiendo.
Art. 12. São partes legítimas para a propositura da ação de usucapião especial urbana:
I – o possuidor, isoladamente ou em litisconsórcio originário ou superveniente;
II – os possuidores, em estado de composse;
III – como substituto processual, a associação de moradores da comunidade, regularmente constituída, com personalidade jurídica, desde que explicitamente autorizada pelos representados.
§ 1o Na ação de usucapião especial urbana é obrigatória a intervenção do Ministério Público.
§ 2o o autor terá os benefícios da justiça e da assistência judiciária gratuita, inclusive perante o cartório de registro de imóveis.
Art. 13. A usucapião especial de imóvel urbano poderá ser invocada como matéria de defesa, valendo a sentença que a reconhecer como título pra registro no cartório de registro de imóveis.
Art. 14. Na ação judicial de usucapião especial de imóvel urbano, o rito processual a ser observado é o sumário.“

Salta aos olhos a prioridade que o Estatuto da Cidade deu tanto ao usucapião de lotes urbanos de até 250m2 (usucapião individual), quanto de áreas com metragem superior (usucapião coletivo). Nenhum obstáculo jurídico deve impedir que a posse, nas condições indicadas pela lei, se transforme em propriedade devidamente registrada. Ações existentes, todavia, terão seu curso normalmente, pois o art. 11 só suspende os efeitos de ações que “venham a ser propostas”, isto é, ações ajuizadas posteriormente ao usucapião especial. Como será possível conciliar os interesses em conflito é tarefa que exigirá grande habilidade de nossos magistrados.

Ao tratar da legitimidade ativa da ação, o legislador foi igualmente pródigo. Admite tanto o litisconsórcio originário ou superveniente, o que vale dizer que, se algum possuidor requerer a propriedade, os demais moradores poderão habilitar-se no mesmo processo. Também a associação dos moradores da comunidade, regularmente constituída, poderá representar os interesses coletivos.

Chama a atenção o fato de que, tanto no usucapião individual como no coletivo, a abertura das novas matrículas, com os respectivos registros, deverá ser feita gratuitamente pelos registradores imobiliários, à vista da sentença judicial que julgar procedente a ação. Sem dúvida, será um enorme ônus aos titulares dos cartórios de registro, no curto prazo; ao longo do tempo, porém, recuperarão o investimento, já que passarão a receber emolumentos (nada baratos, diga-se) toda vez que houver transmissão da propriedade ou outro tipo de serviço registral. Atualmente, nada disso acontece, pois são áreas formalmente inexistentes.

Em processos com centenas de litisconsortes, isso se tornará um problema sério, o que poderá ser resolvido com a determinação, na própria sentença, de prazo escalonado e longo o suficiente para não “quebrar” o registro de imóveis.

Prosseguimos na próxima semana, com o direito de superfície.

Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (41)224-2709, fax (41)224-1156 e e-mail lfqueirozadv@softone.com.br