Leitor de Santa Catarina levantou dúvida nos seguintes termos: “Tenho grandes dúvidas quanto ao termo ‘quite’ referido no artigo 1.335, inciso III, do CC, que trata do direito do condômino para votar nas deliberações da assembléia e delas participar. Pergunto: a administração anterior saiu com dois balancetes não aprovados por unanimidade, pode se candidatar? Mesmo com os balancetes em aberto? O ‘quites’ também se refere aos deveres com o condomínio ou são só a referência financeira como taxa condominial?
Vejamos o que diz o texto legal citado. “Artigo 1.335. São direitos do condômino: […] III – votar nas deliberações da assembléia e delas participar, estando quite,”
Segundo o Dicionário Houaiss, quitação é o “2. ato pelo qual o credor se declara satisfeito do seu direito, exonerando o devedor da obrigação” ou “4. jur. desoneração ou liberação legal ou convencional de uma dívida, obrigação ou encargo, descarga”. O adjetivo “quite” ou o substantivo “quitação” não têm um sentido restrito ao pagamento de dívidas em dinheiro ou, no caso, à liquidação das cotas de rateio somente.
A melhor interpretação da palavra “quite” é de que o condômino esteja “em dia com suas obrigações para o condomínio”, vale dizer, que não haja pendência financeira (incluindo aí multas eventualmente lançadas por desobediência à convenção e ao regimento interno) nem obstáculo legal, como o compromisso de prestar contas de sua gestão, caso tenha exercido a sindicatura. Na hipótese mencionada, como “a administração anterior” [leia-se o síndico anterior] não prestou contas da receita de dois meses, a conclusão natural é de que tal fato constitui, sim, óbice à participação do condômino em assembléia condominial. Porém, não é necessário que o balancete seja aprovado por unanimidade, basta que a assembléia o tenha aprovado, ou não, pelo quórum previsto na convenção.
Síndico inadimplente
Problema não mencionado pelo leitor é o da eleição de síndico inadimplente pelos condôminos em assembléia geral.
Muito embora a lei condicione a participação em assembléia à quitação dos compromissos do proprietário junto ao condomínio, não há qualquer ressalva quanto à eleição de pessoa que esteja em débito, financeiro ou de qualquer natureza, com a comunidade condominial. O Código Civil diz simplesmente o seguinte: “Art. 1.347. A assembléia escolherá um síndico, que poderá não ser condômino, para administrar o condomínio, por prazo não superior a dois anos, o qual poderá renovar-se.”
O legislador partiu do pressuposto de que os proprietários de imóveis em co-propriedade têm maturidade suficiente para escolher o melhor representante legal e administrador de seus interesses comuns. Não é o que sempre acontece, todavia. Temos visto inúmeros casos de condôminos que devem meses de cotas de rateio e, mesmo assim, são eleitos para dirigir o condomínio. O mesmo acontece com síndicos que não prestam contas de sua gestão, que têm pendências sérias com o prédio, estando longe de estarem quites com suas obrigações, e, assim mesmo, são reeleitos para um novo mandato.
No condomínio, como na política nacional, ter a “ficha suja”, estar em débito com a taxa condominial ou com passivo judicial não são obstáculos à eleição do síndico. Somente a convenção, o regimento interno ou a vontade do condômino-eleitor é que salvará o condomínio do desastre anunciado.