Artigo Nº 53 – GRADE AMEAÇA CONDÔMINOS

É defeso a qualquer condômino embaraçar o uso das partes comuns. Esta norma singela da Lei do Condomínio (4.591/64, art. 10, IV) é o que se poderia chamar de “cláusula pétrea” ou fundamental da lei. Sem que todos tenham acesso a qualquer área comum do edifício, sem que possam circular livremente, sem obstáculos ou outros empecilhos, não seria possível uma convivência salutar entre os condôminos. A Lei 4.591/64 distingue as áreas comuns das privativas, disciplinando suas funções com rigor.

Infelizmente, onde há uma norma jurídica sempre há alguém que pretenda burlá-la, gerando conflitos que inevitavelmente deságuam no Judiciário. Exemplo de má compreensão dos desígnios da lei, com relação à utilização das partes comuns, nos foi relatado por leitora de Curitiba, residente em edifício da Rua Comendador Araújo, que resumimos com liberdade.

Tábua rasa

Diz a leitora que dois proprietários de apartamentos, unidos contra a maioria dos demais condôminos, resolveram fechar com grades uma área comum, transformando-a em sala de estar particular, fazendo tábua rasa do que dispõe o Regimento Interno e a Convenção do Condomínio. O síndico entrou com processo judicial objetivando a remoção das ditas grades e  o processo se arrasta há mais de um ano. Como agravante, lembra que as duas unidades são de frente, prejudicando os apartamentos de fundos, que, em caso de incêndio no prédio, não podendo utilizar o elevador e, dependendo da gravidade do sinistro, nem o acesso às escadas, estarão impossibilitados, pelas grades, de salvamento através de escada Magirus que, da rua, possa alcançar o andar em questão. O Corpo de Bombeiros, instado a periciar o edifício, já afirmou ser totalmente inaceitável a existência da dita grade. Pede-nos opinião a respeito.

A questão, prezada leitora, parece estar bem esclarecida somente com seu relato do caso. Trata-se de hipótese que se enquadra perfeitamente no conceito de “embaraço” ao uso das partes comuns. A Lei do Condomínio não permite que qualquer condômino tenha uso exclusivo ou particular de área comum; o regimento interno e a convenção, no seu caso específico, também vedam a apropriação de áreas comuns pelos condôminos (há condomínios que permitem o avanço do uso do corredor quando alguém é o único proprietário das unidades voltadas para aquela parte da área comum); e além do mais, a forma de fechamento foi com grade de ferro, de difícil arrombamento em caso de incêndio.

Sub judice

Como o caso já se encontra “sub judice”, não podemos nos pronunciar sobre seu mérito especificamente, senão analisar a questão de ponto de vista genérico. Em primeiro lugar, houve negligência do condomínio em não tomar medidas imediatas, no momento em que as grades estavam sendo construídas. O síndico tem poder de polícia no condomínio. Poderia ter impedido o ingresso das grades e sua colocação em área de uso comum de todos. Em segundo lugar, não é necessário esperar que a Justiça dê seu pronunciamento definitivo; com base no laudo do Corpo de Bombeiros, que parece ter sido solicitado após o ingresso da ação, é possível obter decisão do juiz antecipando os efeitos da futura sentença, ou seja, determinando a retirada das grades ou ao menos o seu destrancamento, para que, em caso de sinistro, não impeçam o trânsito dos demais condôminos.

Não recomendamos medidas retaliatórias, pois temos sempre em mente a idéia de que “em briga de vizinhos, mesmo quem ganha, perde”. Mas se a Justiça demorar a se pronunciar, ou se o juiz não se sensibilizar deferindo antecipação da tutela jurisdicional, e a situação continuar perturbando o sono dos condôminos, é bom  prevenir-se, tendo à mão uma torquês, uma tesoura corta-cadeado ou um maçarico…

Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (041)224-2709 e fax (041)224-1156.