Construtoras podem ficar um pouco mais tranqüilas agora, pois o Superior Tribunal de Justiça (STJ) parece ter mudado o rumo quanto ao direito de o adquirente de imóvel poder desistir a qualquer tempo do negócio, recebendo de volta a quase totalidade das parcelas pagas.
Em decisão que analisou caso peculiar, o STJ entendeu que continua válida a tese de que “a resilição do contrato de compromisso de compra e venda é direito do comprador, a gerar a restituição das parcelas pagas”, conforme reiterada jurisprudência da Casa, porém, excepcionalmente, não é possível tal desistência se o novo proprietário já recebeu as chaves do imóvel e para lá se mudou, deixando-o “usado”.
Segundo o relator, ministro Aldir Passarinho Junior, a construtora interpôs recurso especial contra acórdão do Tribunal de Alçada de Minas Geral, o qual decidira que “os princípios da autonomia de vontade e da obrigatoriedade do contratado são por excelência a base da doutrina dos contratos”, mas que “se o promissário comprador desinteressa-se em continuar com o vínculo jurídico com a promitente vendedora de unidade imobiliária, admissível se torna a devolução das parcelas por ele pagas…”, ficando ao encargo do adquirente apenas as despesas com IPTU e condomínio. Na hipótese, ele ocupava o apartamento há mais de dois anos.
Em seu voto, o relator argumenta que, “não obstante o entendimento desta Corte, no sentido de que é possível ao adquirente desistir, por impossibilidade de pagamento, da compra que efetuou, também constitui firme orientação a retenção, salvo alguma excepcionalidade, de 25% (vinte e cinco por cento) da importância já paga, a título de compensação pelas despesas operacionais da vendedora, com administração, corretagem, propaganda etc.”
Porém – e aqui a guinada de jurisprudência –, enfatiza o ministro Aldir Passarinho Junior que “deve haver, evidentemente, um limite fático/temporal para o exercício deste direito reconhecido na situação em que, diversamente do comum dos casos, ele [o adquirente] é investido na posse do imóvel e passa a ocupá-lo ou alugá-lo a terceiros, transformando o apartamento, que era novo, em usado, iniciando o desgaste que ocorre com a ocupação, alterando o valor comercial do bem, que naturalmente, quando vendido na denominada ‘1ª locação’, tem maior valia”.
Pondera o magistrado: “Não se me afigura, realmente, razoável, que a empresa construtora fique por muitos anos ainda vinculada à unilateral vontade do comprador desistente, que até por motivo de mera conveniência, após residir no imóvel, vem a ‘desistir’ da aquisição, descartando o apartamento após, convenientemente, dele se servir, por vezes por alguns ou muitos anos.”
O acórdão enfoca ainda peculiaridades da construção civil, mostrando que “os empreendimentos são seqüenciais para evitar-se a desmobilização de maquinário e pessoal”. Adiante fulmina: “A alienação, com a posterior ocupação do imóvel pelo comprador, torna-se, penso, irreversível, não mais possibilitando a desistência unilateral nessas circunstâncias, dada a desconfiguração da própria essência do negócio, que objetivava a venda de imóvel novo, que representa, inclusive, o objeto social das empresas construtoras.”
Acompanharam o voto do relator os ministros João Otávio de Noronha, Massami Uyeda, Sidnei Beneti e Fernando Gonçalves.
A íntegra do aresto pode ser solicitada ao TeleCondo (41-3223-8030, e-mail telecondo@telejuris.com.br), sem ônus, ou pesquisada no sítio do STJ na internet.
Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (41) 3224-2709, e-mail lfqueiroz@grupojuridico.com.br.