Conversando há dias com um administrador de imóveis, lembrava ele da polêmica que durante muitos anos grassou a respeito da cobrança da taxa de intermediação na locação de imóveis, pois as imobiliárias insistiam em cobrá-la dos pretendentes ao aluguel enquanto as autoridades ligadas aos órgãos de defesa do consumidor propugnavam por sua ilegalidade. Dizia ele, o corretor, que hoje tal problema está superado. Não porque se tenha pacificado o entendimento a respeito, mas porque, com a crise que afeta o setor, as imobiliárias não estão cobrando a taxa nem do inquilino e nem do proprietário.
Tirando os excessos e exageros da afirmativa, fica a lição de que, mais uma vez, venceu a lei do mercado. A quebra de braço de 20 anos, ou mais, não foi vencida pelos administradores nem pelas autoridades coatoras, mas pela concorrência decorrente da liberação da economia, que gerou um aumento substancial da oferta de imóveis para locação.
Também passou sem susto o longuíssimo prazo de cinco (5) anos concedido pela Lei do Inquilinato para que o aluguel das locações antigas (anteriores à Lei 8.245/91) ficassem liberadas, sujeitas portando à livre convenção do aluguel e a ação de despejo por denúncia vazia. Tal prazo escoou no dia 20 de dezembro de 1996 e, decorrido quase um ano, não provocou nada remotamente parecido a uma avalancha de ações de retomada em nossos tribunais. Pela simples razão de que o mercado está equilibrado, ou melhor, francamente vendedor.
Dormitam, placidamente, outras disposições da Lei do Inquilinato, que antes provocavam celeumas intermináveis. Dentre elas, destaca-se o capítulo que dispõe a respeito da revisão do aluguel (arts. 68 a 70), cujo número baixou sensivelmente em todo o país, o mesmo ocorrendo com as ações por denúncia vazia nas locações não-residenciais.
Jogo de poder
O que as forças tectônicas da economia não conseguiram derrubar foi o elevado índice de ações de despejo por falta de pagamento. A proporção de inquilinos inadimplentes, diga-se a bem da verdade, sempre foi expressiva. Mas também era substancial o número de locatários que se valia da faculdade legal de purgar a mora, depositando o valor do aluguel com seus acréscimos em juízo, o que levava a ação de despejo à extinção. Na atualidade, reduzido percentual de inquilinos purga a mora em juízo, ou acerta seu débito com o advogado do locador, para evitar o despejo. Grande parte devolve o imóvel ou simplesmente o abandona irresponsavelmente, por sentir-se impotente ou desesperado com a situação.
Se é inegável que a estabilidade econômica afetou profundamente as relações de locação, colocando no limbo inúmeras normas legais anteriormente consagradas ou impugnadas, também criou novas dificuldades, que estão a desafiar a inteligência e criatividade dos operadores da área, como já salientamos em coluna anterior (“Um novo modelo de locação?”). Em São Paulo, já houve um movimento orquestrado no sentido de reduzir em 30% o valor médio do aluguel da cidade. Outras reações certamente virão.
Como observador privilegiado do mercado imobiliário, há mais de 20 anos temos acompanhado o interessante jogo de poder que arrasta ora a lei ora a economia contra ou a favor dos inquilinos e, conseqüentemente, dos proprietários. O ideal de equilíbrio, sempre ressaltado pelos que visam o interesse de todos, é difícil de ser alcançado e sempre se mostra dinâmico ou instável. Os que têm bom senso sabem que é preciso evitar os extremos. Nosso legislador tem mais reagido que agido em favor do bem comum. Nosso judiciário nem sempre consegue restaurar a tranqüilidade quebrada pela lei ou pelas forças políticas e econômicas.
Nossa coluna é de Direito Imobiliário. É bom ficar por aqui. Ponto.
Luiz Fernando de Queiroz é autor doTPD-Direito Imobiliário e do Guia do condomínio IOB, fone 041-224-2709 e fax 224-1156.