Artigo Nº 302 – ATRASO NA OBRA GERA DANO

A majoração do preço dos materiais de construção é fato previsível e constitui risco do próprio negócio desenvolvido pela construtora, não podendo ser erigida como caso fortuito ou de força maior para elidir a sua responsabilidade no descumprimento do contrato, uma vez que tais excludentes, de acordo com a doutrina, são aquelas que impossibilitam de forma absoluta a execução da obra e não simplesmente dificultam sua realização ou a tornam mais onerosa.

Quem assim decidiu foi a Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, em acórdão relatado pelo desembargador Ruy Cunha Sobrinho (Apelação Cível n. 171.293-2), no qual a construtora ainda foi condenada ao pagamento de alugueres ao promitente-comprador a título de lucros cessantes.

Esclarece o relator que o adquirente ingressou com ação de obrigação de fazer, porque a construtora não havia entregue no prazo o imóvel residencial adquirido nem tampouco o imóvel comercial prometido no lugar do primeiro, com pedido alternativo de devolução do que pagara, com os acréscimos legais.

A empresa, entre outras alegações, argumentou que não caberia indenização, pois não teria agido com culpa. A sentença de primeiro grau julgou o pedido parcialmente procedendo. Em grau de apelação, a construtora sustentou que a “imprevisível e insuportável” alta dos preços da matéria-prima utilizada impossibilitou a entrega do imóvel, o que estaria respaldado por cláusula contratual.

Em seu voto, o desembargador Ruy Cunha Sobrinho citou precedentes jurisprudenciais do próprio Tribunal de Justiça do Paraná e de outros colegiados para demonstrar que a construtora que se obriga expressamente a entregar e não o faz “responde pelo inadimplemento contratual”, devendo restituir ao comprador “o valor integral do preço” pago (STJ, Resp.169375/CE). No caso, o atraso na entrega já passara de três anos.

Entende o relator que, se tivesse ocorrido justificável imprevisão, “a construtora deveria ter manejado ação revisional para tentar alterar os termos do contrato, o que não fez, quedando-se silente, enquanto embolsava as prestações pagas pelos compromissários compradores”. Caso fortuito ou força maior – volta a repisar – é aquela força a que não pode resistir o ser humano, como incêndio acidental, naufrágio, furacão, terremoto etc.

Quanto aos lucros cessantes, o magistrado mostrou-se indignado com a assertiva da construtora de que, conforme cláusula contratual, só seriam devidos “mediante compensação” com as parcelas referente à aquisição do bem (as quais já estavam todas pagas). Brada o relator: “Se esta foi a vontade das partes, a referida cláusula representa autêntica ratoeira e que veio a beneficiar exatamente aquele que descumpriu o contrato, que não pode fazer tal alegação em proveito próprio porque vai contra o sistema, uma vez que os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé.”

Em favor da construtora, a Câmara alterou a data em que se iniciará o pagamento dos alugueres ao promitente-comprador, fixando-o em seis meses a contar da data prevista de entrega do imóvel, tempo considerado suficiente para compensar a empresa dos atrasos e imprevistos decorrentes do mau tempo ou falta de material.

Votaram com o relator os desembargadores Cunha Ribas e Dulce Maria Cecconi.

Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (41) 3224-2709, fax (41) 3224-1156, e-mail lfqueiroz@grupojuridico.com.br.