Artigo Nº 301 – QUANTO CUSTA UMA SENTENÇA

A pergunta que fazemos não é o preço de uma sentença, mas quanto custa para o país, em termos de reflexos econômicos, certos acórdãos dos tribunais superiores, especialmente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF).

Recentemente, o ministro Carlos Velloso, do STF, declarou inconstitucional o artigo da Lei do Inquilinato que permite a penhora de bens do fiador locatício, sob o argumento de que a Emenda Constitucional n. 26/2000 teria elevado a moradia à condição de direito fundamental, que não pode ser suprimido.

O ponto de vista contrário está bem sintetizado em duas sentenças (sentido gramatical) do jurista J. Nascimento Franco, no jornal “Tribuna do Direito” de julho/05, que argumenta: “O artigo 6º da Constituição Federal, ampliado pela Emenda Constitucional n. 26, também contempla como direitos sociais, a educação, a saúde e o trabalho. E ninguém se aventuraria em pensar que mencionado dispositivo foi inserido na Carta Magna para obrigar os estabelecimentos de ensino particulares a admitir alunos gratuitamente, os hospitais a internar pacientes de graça, ou os industriais a admitir todos os desempregados…”.

O entendimento do STF que atinge o coração do mercado locatício, reduzindo de 10 para dois o número de pessoas com potencial de serem fiadores de um simples contrato de locação. Contudo, a sociedade reage aos acórdãos da Justiça, nem sempre com o comportamento esperado pelos dignos ministros. Nos dias atuais, certos éditos do STF ou do STJ entram em vigor, “na prática”, mesmo antes de serem publicadas no Diário Oficial, em razão da enorme publicidade que recebem da mídia e na internet. Antigamente, o assunto circulava só entre advogados, levando décadas para influenciar toda a sociedade.

No caso em comento, tão-logo as televisões anunciaram que o imóvel residencial do fiador não mais pode ser penhorado, milhares de imobiliárias e milhões de proprietários de imóveis passaram a pensar em como encontrar uma saída para esta restrição. Solução: exigir fiadores que tenham pelo menos dois imóveis, ou ao menos um imóvel não-residencial. Não sabemos quantos brasileiros se encontram nesta categoria, mas faça você a pergunta: quantos de seus amigos e parentes estão agora em condições de lhe prestar uma fiança locatícia?

O mercado de imóveis para locação já se encontra em crise no Brasil desde 1996/97, com a redução da demanda e também da oferta. Diminuiu drasticamente o número de pessoas dispostas a investir suas economias na construção ou compra de uma casa ou apartamento destinados à locação a terceiros. O retorno é pequeno e o risco, cada vez maior. Ganha-se mais aplicando no mercado financeiro, até na minguada caderneta de poupança. Enquanto isso, milhões de pessoas moram em  condições cada vez mais insatisfatórias.

Não criticamos a decisão do ministro Carlos Velloso, muito menos sua pessoa, pois acreditamos que julgou com o coração. Infelizmente, porém, sentenças como esta, proferidas com benevolência e com vistas à justiça social, pelas reações que provocam nas pessoas, ajudam a manter o Brasil no subdesenvolvimento e o grosso da população sem crédito, no desemprego ou na informalidade, inseguras e sem perspectivas. Está na hora do STF e do STJ contratarem psicólogos, sociólogos e estatísticos, para medir os reflexos de suas bem-intencionadas resoluções.

Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (41) 3224-2709, fax (41) 3224-1156, e-mail lfqueiroz@grupojuridico.com.br.