Artigo Nº 300 – FIANÇA MAL FEITA É NULA

Administradoras de imóveis, movidas pela necessidade de reduzir custos, continuam não tomando as precauções exigidas na locação, como manter contato pessoal com os fiadores para certificarem-se de que estão conscientes da responsabilidade assumida. Há imobiliárias que nem se dão ao trabalho de telefonar ao fiador. Olham apenas o aspecto formal da papelada e da ficha cadastral.

A falta de zelo e de apreciação dos fatos pode trazer problemas ao locador (e por tabela à imobiliária), como mostra decisão da l5a. Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (Apelação cível n. 70011121084), de cuja ementa extraímos o seguinte cerne:

Havendo prova robusta nos autos no sentido de que os requeridos-fiadores foram vítimas de estelionato, correta a sentença que julgou improcedente o pedido de cobrança de débitos decorrentes da fiança prestada em contrato de locação eivada de vício de consentimento, em que a vontade dos requeridos não se formou corretamente.

Relata o desembargador Ricardo Raupp Ruschel que o autor recorre de sentença
de primeiro grau, dizendo que o reconheci mento de falsidade da assinatura da fiadora na ficha cadastral preenchida na administradora não interfere nem anula a assinatura aposta no contrato de locação, reconhecida inclusive por autenticidade perante o notário público (como é praxe em Porto Alegre).

Sustenta, ainda, que o fiador compareceu em cartório para reconhecer sua firma por autenticidade, o que colocaria em cheque sua afirmativa de que “assinou os documentos sem a exata compreensão do que estava assinando em razão de que precisava de dinheiro”, o que evidencia tratar-se de “venda de fiança” por parte do fiador, fato que não pode prejudicar terceiro de boa-fé, no caso o locador. 

O argumento do proprietário não convenceu o desembargador Ricardo Ruschel, todavia. Entende que o fiador foi vítima de estelionato, praticado por pessoas que “vendiam ou vendem fianças para administradoras de imóveis”, mediante o emprego de fraude e do uso de ardil, artifício ou outro meio escuso.

No caso, os estelionatários induziram o fiador, que estava precisando de dinheiro e tinha imóveis, a contrair financiamento fazendo-o assinar diversos documentos, dentre eles o contrato de locação, inclusive em cartório, passando assim a responder pelos débitos do locatário.

Conclui o relator: “A improcedência da presente ação, corretamente, a meu ver, não se deu por que o contrato de locação é nulo ou a assinatura dos requeridos [fiador] não seja autêntica. A nulidade da fiança prestada decorre de vício de consentimento, em que a vontade dos requeridos não se formou corretamente. Atuaram sob influências que atuam anormalmente sobre seus psiquismos, o comportamento dos requeridos difere daquele a que sua vontade livre e consciente os conduziria..” 

Quanto à imobiliária, alfineta o magistrado: “A administração imobiliária não se limita apenas em ´encontrar um inquilino´ para ocupação de um determinado imóvel, requer uma avaliação especial de modo a garantir ao proprietário a certeza do pagamento dos aluguéis e zelar pelo nome e patrimônio da administradora. Cabe a ela a avaliação preventiva, com pesquisa cadastral dos inquilinos e fiadores no momento da locação, a fim de evitar problemas oriundos da mesma.”

Votaram com o relator os desembargadores Ângelo Maraninchi Giannakos, revisor, e Otávio Augusto de Freitas Barcellos.

Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (41) 3224-2709, fax (41) 3224-1156, e-mail lfqueiroz@grupojurídico.com.br.