Artigo Nº 294 – DIREITO REAL DE HABITAÇÃO

A companheira, que conviveu com o de cujus por mais de vinte anos, tem o direito real de habitação sobre o imóvel utilizado para residência do casal.

Quem assim decidiu, com todas as vírgulas, foi a Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, em agravo de instrumento (n. 119007-0) relatado pelo desembargador J. Vidal Coelho.

O fato de a frase “que conviveu com o de cujus por mais de vinte anos” estar entre virgular indica tratar-se de um aposto, o que a torna uma oração subordinada meramente explicativa, daí poder-se inferir que, em princípio, toda companheira “tem o direito real de habitação sobre o imóvel utilizado para residência do casal”. Não fossem as vírgulas se entenderia (erroneamente) que somente as companheiras que tivessem convivido com o falecido por mais de vinte anos teriam direito real de habitação.

Esclarece o relator que a questão está fundamentada no artigo 7º, parág. 2º, da Lei 9.276/96, que dispõe que “Dissolvida a união estável por morte de um dos conviventes, o sobrevivente terá direito real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família.”

No caso concreto, deduzido em agravo de instrumento, o juiz de primeiro grau havia negado pedido de reconhecimento do direito real de habitação, no inventário do falecido companheiro, com quem a agravante convivera por mais de 20 anos, e de quem, em testamento, herdara 25% de seu patrimônio. A sobrevivente alegara que a concessão do direito postulado independia do momento da aquisição do imóvel, sendo suficiente a comprovação de ali terem residido durante os últimos anos da união estável.

No mérito da questão, os herdeiros do falecido sustentaram que a agravante não fazia jus ao benefício “por ser legatária de parte dos bens do espólio, cuja aquisição foi anterior ao período de convivência”.

O entendimento do desembargador J. Vidal Coelho foi no sentido de que não se aplica ao caso o disposto no parág. 1º do artigo 5º da Lei 9.278/96, pelo qual “os bens móveis e imóveis adquiridos por um dos por ambos os conviventes na constância da união estável e a título oneroso” não se pressupõem “frutos do trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a ambos, em condomínio em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito” (caput), “se a aquisição patrimonial ocorrer com o produto de bens adquiridos anteriormente ao início da união” (parág. 1º).

Diz o relator com ênfase:

“Não há que se perquirir, portanto, se o imóvel foi ou não adquirido na constância da união. Em que pese seja a agravante beneficiária no testamento do falecido companheiro, não é crível que, após vinte anos de convivência seja ela privada do imóvel onde com ele residiu, adquirido em data anterior à coabitação, posto que a Constituição Federal, art. 226, parág. 3º, albergou o instituto da união estável, atribuindo-lhe a condição de entidade familiar e submetendo-a às normas e princípios que disciplinam o direito de família e, em particular, as relações oriundas do casamento.”

Votaram com o relator os desembargadores Pacheco Rocha e Conchita Toniollo.

Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (41) 224-2709, fax (41) 224-1156, e-mail lfqueiroz@grupojuridico.com.br.