Quem adquiriu imóvel financiado através de contrato de gaveta também pode requerer a revisão de suas prestações junto ao agente financeiro, como se fosse o primeiro mutuário. É o que decidiu o Tribunal Regional Federal da 4a. Região, com sede em Porto Alegre, dando assim esperança a milhares de pessoas que não dispõem da escritura legal de sua moradia.
A ementa da decisão da Quarta Turma do TRF/4a., como relatada pelo desembargador federal Valdemar Capeletti, está assim redigida (Apelação Cível n. 2002.71.00.014811-9/RS):
“1. Os Contratos de cessão e de promessa de compra e venda firmados sem a anuência do agente financeiro foram reconhecidos, pelo legislador, como passíveis de regularização, igualando os direitos dos cessionários e promitentes-compradores aos dos mutuários originários (art. 22 da Lei n. 10.150/00).
2. Assim, considera-se a demandante ativamente legítima a propor, contra a CEF, ação de revisão de contrato de mútuo habitacional.”
Conta o relator que a decisão de primeiro grau, em que o mutuário pleiteava revisão de seu contrato se mútuo habitacional regido pelo SFH, acolhera a preliminar de ilegitimidade ativa ad causam e extinguira o processo sem julgamento do mérito. Em apelação, o mutuário apresentou argumento parajurídico, mostrando que “o Judiciário não pode ‘fechar os olhos’ para uma p’tica reiterada e muito aceita pela sociedade, tendo em vista que…todos os dias, milhares de pessoas firmam os denominados popularmente ‘contratos de gaveta’.”
O desembargador federal reconhece que, em tese, a Caixa teria razão, sendo a parte autora ilegítima no feito, porque firmara contrato sem anuência do agente financeiro. Porém, a Lei 10.150, de 21 de dezembro de 2000, nos casos de liquidação antecipada de dívida (art. 2o, §§), admite os cessionários e promitentes-compradores do SFH “ditos irregulares”, equiparando-os “para todos os efeitos inerentes aos atos necessários à liquidação e habilitação junto ao FCVS”, dando-lhes inclusive a possibilidade de se utilizarem de seus recursos junto ao FGTS.
Ora, argumenta o relator, se o legislador reconhece e admite a existência de cessionários e promitentes-compradores irregulares, facultando-lhes a regularização para fins de liquidação antecipada, “visualiza-se, nesse ponto, que a legislação se curvou à realidade social contemporânea, a do ‘mundo dos fatos’, em que os contratos sem a anuência do agente financeiro têm se proliferado e, nem por isso, deixado de ser validos e gerar efeitos”.
Logo, se o gaveteiro pode quitar antecipadamente o saldo devedor, também pode mover ação revisional de sua prestação, como se fora o primitivo mutuário.
Tal entendimento, aliado ao de que o adquirente que preencher todos os requisitos da lei também poderá exigir a transferência do financiamento assumindo o saldo devedor da operação, como se encontra contabilizado, e o valor já determinado das prestações, dá oportunidade a que centenas de milhares de mutuários de todo o Brasil possam regularizar sua situação junto à Caixa e demais agentes do sistema, recebendo a escritura definitiva de seu imóvel, passando à condição de proprietários de fato e de direito, com todas as vantagens daí decorrentes.
Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (41) 224-2709, fax (41) 224-1156, e-mail lfqueiroz@grupojuridico.com.br.