Quantos anos dura um ciclo imobiliário? Se você souber, por favor, nos informe. Ao longo das três últimas décadas notamos muitas flutuações no mercado imobiliário, algumas com maior e outras com menor duração. Ora havia euforia, com vendas e locações em alta, ora um certo desânimo, com poucos negócios e imóveis ociosos. O último grande ciclo parece ter-se iniciado em 1995 (ou 1996) e continua até hoje.
As turbulências do mercado financeiro indicam que os sete anos das vacas magras parecem estar no fim. Bens tangíveis, de valor intrínseco, como os de raiz, voltam a ser vistos com bons olhos, seja como reserva de valor (como dizem os economistas), seja como fonte de renda suplementar da aposentadoria.
Não para desanimar, mas para prevenir, hoje, mais uma vez, trazemos decisão desfavorável ao locador, em caso peculiar vindo do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, em que a inércia do locador em propor ação de despejo, teria ocasionado a “transmudação do contrato de aluguel para comodato”.
A ementa do acórdão está assim redigida: “Falta interesse processual ao locador para interpor ação de despejo quando o locatário deixou de pagar aluguel por mais de oito anos e exerceu a posse direta, mansa e pacificamente durante esse período.”
Cadê o vínculo?
Conforme relata o relator do aresto, desembargador Atapoã da Costa Feliz, o locador ajuizou ação de despejo por falta de pagamento, com base em contrato de locação iniciado em março de 1986, com término em março de 1987, sem cláusula de prorrogação por tempo indeterminado. Ao término do contrato, o inquilino permaneceu no imóvel por mais de oito anos sem haver a renovação do contrato ou mesmo pagar aluguel. Tampouco o locador procurou retomar a posse da área.
Ora, diz o des. Atapoã, “se [o inquilino] ficou morando no imóvel por mais de oito anos sem pagar nenhuma remuneração, descaracterizou a possibilidade de haver a prorrogação automática da locação por prazo indeterminado”, por faltar “um dos requisitos essenciais para caracterizar a locação, qual seja, a remuneração”.
O vínculo locatício existente inicialmente perdeu substância com o tempo. Quando teria ocorrido o seu rompimento? É difícil dizer. Em termos alegóricos, pode-se imaginar que houve inicialmente um afrouxamento do vínculo locatício, seguido da perda gradual de sua substância, até que finalmente desapareceu por completo, ao menos aos olhos da Justiça. Como dizia o célebre Von Ihering, evocando os romanos, “a Justiça não socorre os que dormem”.
Casos como este existem muitos, especialmente originários de locação feita com intuito de preservar terrenos ou áreas rurais. Cede-se imóvel a determinada pessoa, por aluguel irrisório, para que ela, indiretamente, ajude a cuidar do bem, evitando que seja invadido etc. Porém, tal contrato deve ser renovado anualmente, por escrito, e o aluguel deve ser pago, por menor que seja. A corrosão do vínculo locatício poderá gerar situação desfavorável ao locador, como visto acima.
Em tempo, também participaram da decisão da Primeira Turma Cível do TJ sul-mato-grossense o desembargador Hildebrando Coelho Neto e o juiz convocado Romero Osme Dias Lopes. Para consultar: Apelação Cível n.2001.009634-0000-00.
Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (41)224-2709, fax (41)224-1156, e-mail lfqueirozadv@softone.com.br.