No jornal “Tribuna do Direito”, de São Paulo, encontramos pequena nota sobre tema de vizinhança, com o título “Uso indevido de imóvel pode levar a indenização”, em que se fazia referência a julgado do Superior Tribunal de Justiça. Através do Telejuris Consultoria e Pesquisa, obtivemos cópia da íntegra, a qual passamos a dissecar.
A questão é velha conhecida: a infração a elementares direitos de vizinhança, problema que certamente afligiu os moradores das urbes mais antigas.
No caso julgado pelo STJ, a briga começou quando um imóvel localizado em zona residencial foi alugado para uma editora de revistas, que não cumpriu as normas de silêncio das posturas municipais. Diante dessa atividade irregular, causadora de danos à vizinhança, os moradores das proximidades instauraram procedimento administrativo que resultou no fechamento do escritório. Porém, dias após, os trabalhos foram reiniciados.
Angustiado, um dos moradores ingressou com ação ordinária de preceito cominatório, com fundamento no art. 554 do Código Civil. Tal dispositivo legal é aquele que diz que “o proprietário, ou inquilino de um prédio, tem o direito de impedir que o mau uso da propriedade vizinha possa prejudicar a segurança, o sossego e a saúde dos que o habitam”.
O juiz da vara indeferiu o pedido por falta de interesse processual, extinguindo o feito, tendo em vista a existência do processo movido pela prefeitura.
Apreciando a apelação do morador, a Sexta Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo negou provimento ao recurso, também entendendo não haver interesse de agir em face da ação com o mesmo objetivo.
No recurso especial junto ao Superior Tribunal de Justiça, o morador sustentou não haver conexão ou litispendência entre as demandas, visto que a prefeitura age no interesse da coletividade, almejando a interdição do imóvel, enquanto o recorrente tem interesse próprio e funda sua pretensão em dispositivo do direito privado, objetivando a cessação das atividades desenvolvidas.
O relator do recurso especial, ministro Ruy Rosado de Aguiar, deu ganho de causa ao morador. De seu voto extrai-se o seguinte o parágrafo, de rara síntese:
“Além disso, há interesse de agir. O proprietário perturbado pelo mau uso da propriedade vizinha tem a ação de dano infecto, que não se extingue pelo fato de o Município ter adotado medidas administrativas ou judiciais para fazer prevalecer os seus regulamentos. Os interesses não são da mesma natureza e por isso inconfundíveis. Mesmo porque, em país onde seguidamente os interesses públicos são privatizados, isto é, são exercidos em favor do privado e não do público, não convém seja retirado do cidadão o direito de defender em juízo o seu interesse, ainda que com o mesmo objetivo perseguido pela administração pública.”.
Seguindo o relator, a Turma do STJ, por unanimidade, conheceu do recurso e deu-lhe provimento.
A ementa da decisão diz o seguinte:
“Não há litispendência entre a ação de dano infecto promovida pelo proprietário com base no art. 554 do C.Civil, e a ação intentada pelo Município, contra a mesma ré, para fazer prevalecer os seus regulamentos. A propositura da ação pelo Município não extingue o interesse de agir do proprietário prejudicado pelo mau uso da propriedade.”
Cópia do acórdão pode ser solicitada, sem ônus, pelo fone (041)224-2709 ou pelo fax (041)224-1156.
Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB.