Artigo Nº 164 – REGIMENTO NÃO É CONVENÇÃO

O projeto do novo Código Civil, em fase final de aprovação pelo Congresso Nacional, traz algumas novidades que é bom conhecer. Já mencionamos a limitação da multa moratória em 2% (dois por cento), índice que estimulará ainda mais a inadimplência, trazendo sérias dificuldades para o síndico. Seria uma multa razoável se a inflação fosse de 0% (zero por cento) ao ano, o que, infelizmente, não ocorre.

Vejamos hoje o que, a nosso ver, é uma complicação do futuro Código Civil. Diz o art. 1.351: “Depende da aprovação de dois terços dos votos dos condôminos a alteração da convenção e do regimento interno; a mudança da destinação do edifício, ou da unidade imobiliária, depende de aprovação pela unanimidade dos condôminos.”

Não nos parece de bom senso exigir quórum de 2/3 (dois terços) dos condôminos para alterar o regimento interno do condomínio. Que se exija tal comparecimento para modificar a convenção, até é aceitável, pois o regulamento maior do edifício não deve, mesmo, ser mexido com grandes facilidades, se bem que, em geral, é muito difícil conseguir um quórum de dois terços das frações ideais, em qualquer prédio, a não ser que o assunto em pauta provoque impacto. Não se pode esquecer que, se excluídos os inadimplentes e residentes em outras cidades, não sobram muito mais do que 60 ou 70% de condôminos aptos a comparecer à assembléia e votar.

Para que exigir quórum de dois terços para uma simples alteração do regimento interno, se este instrumento legal deve ser algo flexível, adaptável, que regule o dia-a-dia do condomínio no que diz respeito ao uso das coisas comuns (portaria, garagem, piscina, salão de festas etc.), sem afetar nem colidir com as normas gerais impostas pela convenção e pela Lei do Condomínio? Para que engessar o regimento interno, tornando-o tão inflexível quanto a convenção do condomínio? Ao que parece, o legislador pensa que convenção e regimento são a mesma coisa, que têm a mesma natureza ou que servem aos mesmos propósitos.

Unidade diferenciada

Interessante, na parte final do art. 1.351, a menção de que tanto o edifício, como um todo, pode mudar sua destinação (exemplo: passar de comercial para residencial ou misto, ou de residencial para comercial ou misto), como a possibilidade de haver mudança da destinação de apenas de uma ou de algumas unidades, o que não está previsto na atual legislação. Será possível, por exemplo, que, pelo quórum unânime, se permita que os apartamentos do térreo – mas somente do térreo – sejam transformados em lojas, sem qualquer ônus ou mediante o pagamento da indenização que for ajustada. A cobertura, hipoteticamente, poderá ser transformada em um clube ou restaurante, se esta for a vontade de todos os condôminos.

Muitas são as falhas e inovações do projeto do Código Civil, o que veremos no decorrer das próximas semanas. Desde já fazemos o alerta de que nosso legislador não fez a devida lição de casa, ou seja, não estudou direito o assunto nem pesquisou a realidade do País. Bem ou mal – e acreditamos que sobressai-se o bem – a Lei 4.591/64, apesar de seus 37 anos, teve o mérito de, em apenas 28 artigos, criar um arcabouço jurídico que fez com que o condomínio se tornasse uma instituição nacional, atraente e invejada.

Temos receio de que, na forma como está elaborado, o projeto do novo Código Civil vai representar um retrocesso, matando aos poucos o que levou quase quatro décadas para ser construído.