Artigo Nº 220 – NOVO RATEIO É POLÊMICO

Aos poucos a sociedade brasileira começa a demonstrar sua insatisfação com alguns pontos do novo Código Civil, na parte que trata do condomínio edilício. Afora a questão da multa de “até dois por cento”, que ensejou aumento da inadimplência a ponto de haver edifícios sem dinheiro para pagar a conta de luz (cf. noticiado em TV nacional), a questão do rateio das despesas deixou muitas pessoas indignadas.

Qual o melhor critério para dividir as despesas do condomínio? Qual o mais justo ou o mais solidário?

Na vigência da Lei 4.591/64, os condôminos tinham ampla liberdade para fixar suas quotas de despesa. Dizia a regra: “Salvo disposição em contrário na convenção, a fixação da cota no rateio corresponderá à fração ideal de terreno de cada unidade.” (Art. 12, § 1o). Estabelecia também que “A cada unidade caberá, como parte inseparável, uma fração ideal do terreno e coisas comuns, expressa sob forma decimal ou ordinária.” (Art. 1o, § 2o), sem indicar de que forma a edificação deveria ser partilhada idealmente.

O Código de 2002, além de suprimir a ressalva “Salvo disposição em contrário na convenção”, criou norma rígida de rateio, afirmando que constitui dever dos condôminos “Contribuir para as despesas do condomínio, na proporção de suas frações ideais;” (Art. 1.336, I),  e que “A fração ideal no solo e nas outras partes comuns é proporcional ao valor da unidade imobiliária, o qual se calcula em relação ao conjunto da edificação.” (Art. 1.331, § 3o). Conseguiu, com isso, desagradar gregos e troianos.

As diferenças culturais do País e a variedade crescente de empreendimentos que se valem da incorporação imobiliária em condomínio indicam que as normas antigas de rateio não deveriam ter sido modificadas. Ninguém melhor que os próprios condôminos, reunidos em assembléia extraordinária com quórum elevado, para disciplinar o interesse em jogo. Tanto isto é verdade que são pouquíssimas as lides judiciais que tratam de conflitos acerca dos parâmetros de divisão das despesas condominiais.

O projeto de lei n. 611, de 2003, em trâmite no Congresso Nacional, modifica o artigo 1.336 do novo Código Civil, com proposta que, a nosso ver, não resolve a questão, além de criar embaraço e dificultar a administração do prédio. Altera o inciso I do artigo 1.336 do Código Civil, dispondo que é dever dos condôminos “contribuir para as despesas do condomínio, na proporção de suas frações ideais, exceto as decorrentes do uso das partes comuns, rateadas igualmente entre todos”.

Pergunta-se: qual despesa do condomínio não decorre do uso comum ou do interesse comum de todos os condôminos? A água que todos utilizam não é de uso comum? A atividade do síndico ou da administradora não atinge a esfera pessoal de cada morador do prédio? Será muito difícil e custoso inventar modos de separar quais as despesas decorrem do uso das partes comuns e quais não aproveitam a todos.

Num condomínio utópico, quem sabe de um futuro nem tão distante, haverá sensores e controladores eletrônicos que formularão um balancete mensal dizendo exatamente quantas vezes cada um subiu nos elevadores, quantos convidados recebeu em casa, quantos litros de água gastou, quanto monóxido de carbono seu carro liberou na garagem, quantos litros e quilos de lixo inorgânico produziu, permitindo assim que cada um pague meticulosamente de acordo com seu uso pessoal.

Enquanto isso não acontece, a melhor solução, ainda, consiste em deixar o modo de rateio e a maneira de fazer o cálculo das frações ideais a cargo dos proprietários.