Administrar imóveis de terceiros nunca foi fácil. Mais difícil tornou-se a atividade nos dias atuais, em que vivemos um período de intensa responsabilização dos prestadores de serviço, sujeitos que estão ao pagamento de indenizações por qualquer deslize em seu comportamento. Concorrência feroz e campo jurídico inóspito fazem com que administrar imóveis seja, sim, só para profissionais.
A propósito, veio-me às mãos julgado do Tribunal de Alçada do Paraná (151.603-2) sobre conflito envolvendo contrato de administração, em que a imobiliária foi obrigada a indenizar seu cliente de todos os aluguéis e encargos não pagos pelo inquilino em razão de, em sua publicidade, ter constado que a garantia seria “durante todo o tempo do contrato”, embora no instrumento próprio tivesse ficado estabelecido que a garantia seria limitada no número de meses e no valor dos aluguéis.
O acórdão é longo, o que exige alguns cortes. Extraem-se da ementa as seguintes lições:
“1. Evidencia-se no contrato de administração imobiliária típica atividade de prestação de serviço, em que há um prestador e um tomador de serviços; o proprietário que entrega o imóvel para administração e a imobiliária que o administra profissionalmente e mediante certa remuneração, sendo aquele o destinatário final dos serviços prestados, caracterizando-se desse modo como relação sujeita ao regramento do Código de Defesa do Consumidor.
2. A publicidade relativa aos serviços oferecidos, tal como a cláusula de garantia de pagamento de alugueres, condomínio e impostos, não se resume no seu atrativo para angariar clientela e auferir maior lucro, mas, por força de lei, integra o contrato que vier a ser celebrado (art. 30, CDC), tendo o efeito de obrigar o prestador de serviços.
3. Veiculada propaganda de que a garantia de pagamento dos alugueres, condomínio e impostos vale durante todo o tempo do contrato, mesmo que o inquilino não pague, tem-se como dúbia a cláusula que procura restringir a abrangência da garantia quanto ao valor ou o tempo de sua validade, havendo nessas circunstâncias de ser interpretada de modo mais favorável ao consumidor (art. 47, CDC).”
O relator do aresto, juiz Augusto Côrtes, fundamenta a decisão da Quinta Câmara Cível do TA paranaense com extensos argumentos. Reconhece, como é evidente, que “a prestação de serviço de administração imobiliária envolve um mercado disputado, exigindo criatividade na obtenção de clientela e superação da concorrência pelo oferecimento de serviços especiais”. Só que a divulgação dos serviços prestados tem de ser coerente com o conteúdo dos contratos celebrados com os proprietários. Caso contrário, aplicam-se as regras do Código de Defesa do Consumidor, especialmente se o contrato de administração for do tipo de adesão, ou seja, modelo pronto, já impresso, que não admite discussão de seu conteúdo.
Também participaram da decisão os juízes Tufi Maron Filho e Arno Knoerr.
Não sabemos ainda o resultado do recurso interposto da decisão do Tribunal de Alçada. Enquanto isso, mais uma vez, chamamos a atenção dos corretores e administradores de imóveis para a relevância e seriedade do papel que desempenham. E para lembrar alguns mais saudosistas que o tempo da aventura e do empirismo acabou. Mesmo os mais preparados encontram dificuldade para navegar nas armadilhas do mundo jurídico, onde o que está escrito nem sempre vale e o que se promete pode ter mais valor do que o que se contrata.
Os tempos mudaram, (in)felizmente.
Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (41)224-2709, fax (41)224-1156, e-mail lfqueirozadv@softone.com.br.