Por falta de tradição, pessoas idosas que são proprietárias de imóveis têm deixado de tirar o máximo proveito do patrimônio que amealharam ao longo da vida, vivendo com parcas pensões. Seus ganhos poderiam aumentar consideravelmente se vendessem a nua-propriedade de seus imóveis, continuando a usufruí-los enquanto vivessem.
A alienação da nua-propriedade com retenção do usufruto não é novidade, inclusive em países europeus. Empresas especializadas adquirem somente a propriedade sem seus atributos, levando em conta o valor do imóvel e a expectativa de vida de seu proprietário (ou de ambos, se for casal).
Pode parecer chocante, mas é isso que acontece. O idoso, com ou sem herdeiros, vende seu domínio sobre todos ou o único bem que possui, por um preço naturalmente inferior ao de mercado, porque só deixará o imóvel no dia em que falecer. Até lá, continua como usufrutuário, com todos os direitos. Os únicos “prejudicados” são os eventuais herdeiros.
Modalidade apreciada pelos idosos é a do pagamento parcelado, sem número fixo de prestações. Por exemplo, se o imóvel vale R$ 300 mil e o proprietário tiver 75 anos, poderá receber hipoteticamente R$ 120 mil à vista ou R$ 1 000,00 por mês até morrer. Se viver mais de 10 anos, o adquirente é obrigado a continuar pagando as prestações, mesmo que o somatório delas ultrapasse o valor estimado da nua-propriedade. O contrário também é verdadeiro: no caso de óbito em curto prazo, o adquirente fica com a vantagem de ter feito um negócio lucrativo. Outra hipótese é a do recebimento do valor correspondente ao aluguel do imóvel, embora continue nele residindo.
Quanto vale a nua-propriedade e quanto vale o usufruto de um imóvel? Por falta de critério melhor, costuma-se dividir por dois o valor de mercado atual. Num imóvel de R$ 400 mil, R$ 200 mil corresponde ao usufruto e R$ 200 mil à nua-propriedade. Mesmo não havendo empresas dedicadas a esse tipo de especulação, no Brasil, chamamos a atenção do mercado imobiliário para o fato, pois há muitos investidores interessados em aplicar em boas oportunidades de negócio.
Legalmente e moralmente não há óbices à realização de compras e vendas de imóveis com tais características. Afinal, os idosos serão os maiores beneficiários. Terão aumento substancial de suas rendas e deixarão poucos motivos para brigas e desavenças entre herdeiros.
Vale lembrar que “o usufrutuário tem direito à posse, uso, administração e percepção dos frutos” (Cód. Civil, art. 1.394), não havendo, pois, receio de perder o imóvel. O usufruto pode ser vitalício (até o falecimento do marido e da mulher, por exemplo) e, além disso, “o usufrutuário pode usufruir em pessoa, ou mediante arrendamento, o prédio, mas não mudar-lhe a destinação econômica, sem expressa autorização do proprietário” (Cód. Civil, art. 1.399).
O usufrutuário tem obrigação, sim, de pagar as “despesas ordinárias de conservação” e as prestações (condomínio, v.g.) e tributos devidos, mas “incumbem ao dono as reparações extraordinárias e as que não forem de custo módico” (Cód. Civil, art. 1.404). Ou seja, muitos são os bônus e poucos os ônus do usufrutuário.
Resta saber se os operadores e investidores do mercado imobiliário estão dispostos a correr os riscos e a enfrentar, ainda que de forma positiva, o tabu da morte.
Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (41) 3224-2709, e-mail lfqueiroz@grupojuridico.com.br.