Artigo Nº 50 – VENDA AINDA É OBRIGAÇÃO

Sem sombra de dúvida, a forma mais freqüente de transação imobiliária é a compra e venda. E, por isto mesmo, a consideramos como a mais importante. É, talvez, o ponto de encontro mais evidente entre o fato econômico e o fato jurídico, dele não se podendo dizer que um ou outro é mais relevante.

A compra e venda, versão moderna da troca que se praticava primitivamente, é uma conseqüência  do surgimento da moeda como denominador comum de todas as coisas.

Do ponto de vista jurídico e limitado à orientação seguida pelo direito brasileiro, diz-se que “pelo contrato de compra e venda, um dos contraentes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro a pagar-lhe certo preço em dinheiro”(Cód. Civil, art. 1.122). Ou, em outras palavras, é o contrato pelo qual o vendedor se obriga a transferir ao comprador o domínio de alguma coisa, mediante o pagamento de certa importância em dinheiro.

A compra e venda é um contrato sinalagmático, em que os contraentes se obrigam reciprocamente. É também um contrato consensual, porque depende do mútuo consenso das partes para que fique perfeito; oneroso, porque cada contratante se obriga a dar ao outro o equivalente do que recebe; e comutativo, porque o preço fixado deve ser equivalente à coisa vendida. Quando  a compra e venda tem por objeto coisa imóvel, além das características acima, o contrato assume o aspecto de formal, pelas exigências que a lei determina para a sua perfeição.

A compra e venda não se confunde com a troca, porque tem um elemento novo, o preço representado em dinheiro, ou valor redutível a dinheiro; nem com a dação em pagamento, que é forma de se extinguir e não de se criar uma obrigação; ou com a doação, onde falta o elemento preço.
 
Obrigação de entrega

Como mencionado, pelo contrato de compra e venda, um dos contraentes SE OBRIGA a transferir o domínio de alguma coisa. Não é o contrato pelo qual uma das partes entrega a coisa.

Este é um ponto fundamental do contrato de compra e venda, que, infelizmente, até hoje parece não ter sido totalmente aprendido pela população em geral. Quem adquire um imóvel, por exemplo, mediante um recibo de sinal de negócio, compromisso de compra e venda ou outro documento semelhante, normalmente acredita já ser proprietário, mas não é.  É uma noção equívoca que se tem de que com o contrato de compra e venda se torna dono dela imediatamente. Deste convicção resulta uma profunda indignação quando o vendedor, seja por que motivo, se recusa a entregar a coisa (traditio) ou a assinar a escritura que transfere o domínio.

Pelo sistema jurídico francês, de fato, o contrato é suficiente para transferir o domínio: a obrigação de dar e a obrigação de transferir acham-se reunidas em um só ato. O mesmo não ocorre, entretanto, no sistema brasileiro, que segue a orientação germânica. Pelo nosso sistema, para que a compra e venda se realize, ou seja, se complete, é necessário que o vendedor faça a traditio (entrega da coisa móvel) ou que transfira o domínio pela transcrição (hoje, registro, no caso de imóveis).

Se não houver a tradição ou o registro do imóvel, o comprador somente tem um direito pessoal contra o vendedor, para haver a coisa, ou ser ressarcido pelas perdas e danos. E o vendedor, por sua vez, tem somente o direito de exigir o preço.
O art. 620 do Código Civil é claro ao estabelecer que “o domínio das coisas não se transfere pelos contratos antes da tradição” e o art. 533 prescreve que “os atos sujeitos à transcrição não transferem o domínio, senão da data em que se transcreverem”.

Bons negócios.

Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (041)224-2709 e fax (041)224-1156.