Quase todos sabem que o marido e a mulher precisam assinar a escritura definitiva de transferência do imóvel. O que muitos ignoram, inclusive profissionais da área, é que o consentimento do cônjuge também pode ser importante nos contratos preliminares de compra e venda, como o recibo de sinal de negócio e a promessa ou compromisso de compra e venda. Caso o promitente-vendedor venha a se arrepender do negócio, mesmo que o promitente-comprador tenha pago todo o preço, não poderá requerer a adjudicação compulsória do bem, pois nem mesmo o juiz tem o poder de suprir a vontade não manifestada da mulher (ou do marido, se foi este que não anuiu na promessa).
Decisão neste sentido foi proferida pelo Tribunal de Alçada de Minas Gerais, em recurso de embargos infringentes relatado pelo juiz Marino Costa (in Boletim do Direito Imobiliário, ano VIII, n.º 9, março/97), com a seguinte ementa: “A promessa de compra e venda de imóvel contratada apenas pelo marido impossibilita o suprimento judicial do consentimento da mulher para outorga de escritura definitiva, seja em ação de adjudicação compulsória ou em mera execução de obrigação de fazer, cabíveis somente contra quem pode ser qualificado como promitente-vendedor.”
Em virtude da lei
Explica o juiz relator que os autores procuraram o suprimento judicial do consentimento da embargada, para outorga de escritura de compra e venda, com lastro em promessa de venda subscrita apenas por seu marido. Embora estejam os autores na posse de seus respectivos imóveis há mais de 20 anos, outro caminho hão de perseguir para obter o seu domínio, que não obrigar a embargada a lhes outorgar escritura, via adjudicação compulsória, ou mesmo substituir o seu consentimento, a sua vontade. E por um fato muito simples, argumenta. É que ela não assumiu qualquer compromisso com os autores. Não assinou promessa de venda, juntamento com seu marido. Não assinou recibos de pagamento.
No acórdão embargado, que deu origem aos embargos infringente, o juiz Lopes de Albuquerque, vogal vencedor, ressaltou o direito em favor da mulher, destacando que se a apelada não subscreveu, como outorgante-vendedora, as referidas escrituras, nem está obrigada por lei a honrar o compromisso assumido por seu esposo, força é convir que nada lhe pode ser exigido em relação aos negócios jurídicos nelas instrumentalizados. Entender o contrário equivale, data venia, a negar vigência ao art. 5.º, inc. II, da Constituição da República, por força do qual “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei.”
Conferir a opção
Moral da história: Quando for comprar um imóvel através de recibo de sinal ou promessa de venda certifique-se de que o outro cônjuge também está de acordo com a alienação e que manifeste sua vontade apondo sua assinatura no instrumento contratual preliminar ou no recibo de pagamento. Da mesma forma, se o bem estiver sendo oferecido por intermédio de corretor de imóveis ou imobiliária, conferir a opção de venda ou o contrato de intermediação imobiliária para saber se ambos os cônjuges estão se obrigando em relação ao contrato.
Não estamos dizendo que a assinatura da mulher seja essencial no contrato inicial de venda. Mas se o marido se arrepender do negócio ou se não conseguir obter posteriormente a anuência de sua esposa, tornando impossível a outorga de escritura definitiva, a questão só poderá ser resolvida mediante o pagamento de indenização, não cabendo a adjudicação compulsória com o suprimento da vontade da mulher pela autoridade do juiz. E , como sabem os que militam nos tribunais, grande parte das ações de indenização, mesmo quando julgadas procedentes, resultam estéreis, por falta de bens do devedor para penhora e execução.
Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (041)224-2709, fax (041)224-1156, e-mail lfqueiroz@staffnet.com.br.