A interpretação literal da lei pode levar a conclusões absurdas. Há dias, no jornal de maior circulação de Curitiba, estampou-se reportagem com o título "Alteração na fachada exige alguns cuidados" (correto) e o nariz-de-cera "A modificação na área externa de um edifício só é possível com a aprovação de 100% dos moradores" (nem sempre, como veremos). A questão está regulada pela Lei do Condomínio em seu art. 10, que diz:
"É defeso a qualquer condômino:
I – alterar a forma externa da fachada;
II – decorar as partes e esquadrias externas de forma diversa da empregada no conjunto da edificação;
III – destinar a unidade a utilização diferente da finalidade do prédio, ou usá-la de forma nociva ou perigosa ao sossego, à salubridade d à segurança dos demais condôminos;
IV – embaraçar o uso das partes comuns.
§ 1o – O transgressor ficará sujeito ao pagamento de multa prevista na convenção ou no regulamento do condomínio, além de ser compelido a desfazer a obra ou obstar-se da prática do ato, cabendo ao síndico, com autorização judicial, mandar desmanchá-la à custa do transgressor, se este não a desfizer no prazo que lhe for estipulado.
§ 2o – O proprietário ou titular de direito à aquisição da unidade poderá fazer obra que modifique sua fachada, se obtiver a aquiescência da unanimidade dos condôminos.
Com base no texto acima, tem-se difundido a noção de que para qualquer alteração da fachada do prédio é preciso aprovação de 100% dos condôminos. Contudo, fazendo-se uma interpretação sistemática e teleológica do texto legal, chegaremos à conclusão de que a unanimidade só é exigida quando a modificação ferir o conjunto arquitetônico do prédio, deixando-o desfigurado. Seu objetivo (da norma legal) foi o de evitar que a fachada do edifício se transformasse num carnaval de cores e materiais, com cada morador decidindo a decoração de sua sacada ou área externa.
Em outras palavras, a lei não visou tombar a fachada do prédio, preservando-a intacta para todo o sempre.
O objetivo da lei não foi nem é o de impedir que o edifício passe por processo de transformação e melhoria, recuperando sua imagem original ou adotando nova feição plástica, com o emprego de materiais mais modernos (alumínio em vez de ferro, pastilha ou granilha em lugar de pintura). O importante é que a modernização do prédio não lhe traga um dano estético.
Como ficaria a questão do quórum para aprovação da modificação de fachada?
A questão é simples. Sempre que haja alteração visando atender capricho de um ou de poucos condôminos, com quebra da harmonia arquitetônica do conjunto (dano estético), será necessário o quórum de 100% dos proprietários presentes à assembléia. Exemplo: o edifício tem 22 andares e os moradores do 5o, do 7o e do 15o andares querem trocar pintura verde por pastilha cinza. Mesmo que fique horroroso, se todos aprovarem tal mudança, é possível fazê-la.
De outro lado, se em razão de infiltração ou gasto contínuo com pintura, os condôminos decidirem empastilhar todo o prédio, dando-lhe nova fachada, moderna e mais duradoura, o quórum exigido não será de unanimidade, mas de 2/3 (dois terços) dos proprietários, ou o que estiver previsto na convenção para obras necessárias.
Como disse o administrador de condomínio Olívio Lopes Filho, na matéria mencionada no início, a lei precisa ser flexibilizada (melhor interpretada, diríamos), não concordando que apenas um voto possa deixar tudo como está, e enfatizando que uma pessoa apenas não pode ter todo o poder.
O tema é polêmico e a ele voltaremos, pois o espaço acabou.